Marco Pereira, 1990

21h30, terça-feira. Depois do jantar encontrámo-nos no sítio habitual. Já não nos víamos há mais de dois meses. Cumprimentámo-nos com um abraço e começámos a falar de tudo (menos de vinho). Após meia hora de novidades, levanto-me e vou ao frigorífico buscar uma garrafa de branco. Começámos então a falar de vinho: do que está à nossa frente, de outros. Explico-lhe o conceito do blog. Posso constatar, sem reservas, que tenho comigo um apaixonado por vinho. Uma paixão relativamente recente, é certo.

Conheci o Marco no segundo ano da Faculdade, após um exame de Literatura Inglesa. Apercebemo-nos de que morávamos a uma distância curta e começámos a conversar. Cedo nos tornámos bons amigos. Quando estávamos juntos, bebíamos finos, essencialmente. O meu interesse pelo vinho começava a aumentar, mas o Marco interessava-se mais por whisky. Quando concluímos a licenciatura, eu inscrevi-me no mestrado e ele decidiu tentar a sua sorte em Inglaterra. Trabalhou num hotel em Tarporley, durante um ano. E, apesar de os seus avós terem uma casa em terra de bom vinho, Almendra (perto de Vila Nova de Foz Côa), foi apenas em Inglaterra que o Marco começou a interessar-se realmente por vinho. Foi aí que teve o seu primeiro contacto com castas internacionais e com preços que lhe pareciam absurdos. Às vezes servia copos de vinho de muitas libras a hóspedes que se limitavam a sorvê-los, sem o menor interesse. Teve também a oportunidade de provar vários vinhos da carta, como por exemplo, um Shiraz australiano (que adorava) e um Malbec argentino (que detestava). Hoje, quem sabe, talvez tivesse outras opiniões.

O salário não era mau, mas as saudades do Porto (e de algumas pessoas) fizeram-no regressar. Começou a trabalhar na Associação de Turismo do Porto e a ter que dialogar com turistas, diariamente. Desde junho de 2016, tem prestado serviços ao IVDP (Instituto dos Vinhos do Douro e Porto). No edifício da Rua Ferreira Borges, faz visitas e provas a portugueses e estrangeiros. O seu conhecimento sobre vinho aumentou exponencialmente. Fala com entusiasmo sobre vinhos que o deslumbraram: dois Quinta de S. José (um tinto reserva e um porto vintage), o vinhas velhas da Quinta do Crasto, o Turris da Niepoort. Dá para entender que (ainda) não é um grande entusiasta de vinhos brancos. Contudo, é maioritariamente com vinhos do Porto que trabalha e fala deles com rigor e orgulho. Sente que lida com produtos excepcionais, mas pouco valorizados por nós, portugueses. Mas ele faz genuinamente bem o seu trabalho e os turistas compram muitas garrafas. Não tenho dúvidas de que hoje tenho, à minha frente, um embaixador do vinho do Porto. Todavia, estamos a beber vinho branco. Um tipo de vinho que ele nem aprecia muito. A conversa está boa e nem damos conta: olha, a garrafa está quase no fim.